sexta-feira, 5 de março de 2010

Polêmico aborto da menina de 9 anos estuprada completa um ano

A história da menina de 9 anos, que engravidou de gêmeos ao ser estuprada pelo padrasto e foi submetida a aborto rodeado de polêmica, virou documentário com fins educativos. A ONG Ipas Brasil, há mais de 30 anos atuando na defesa de direitos reprodutivos da mulher, lança às 10h de hoje, no Recife, vídeo para provocar debates em faculdades de saúde do País. Há um ano, o caso de Alagoinha, Agreste de Pernambuco, ganhou repercussão internacional pela tentativa do então arcebispo de Olinda e Recife, dom José Cardoso, de evitar a interrupção da gravidez. Ele condenou à excomunhão médicos do Centro de Saúde Amaury de Medeiros (Cisam), onde o aborto foi feito, e a mãe da garota.
“O caso ilustra a triste realidade do Brasil, onde meninas e adolescentes são vítimas de violência sexual, buscam assistência nos serviços de saúde e muitas vezes não têm conhecimento de seus direitos”, explica a psicóloga Lia Silveira, do Ipas, que viu desfecho positivo na história de Alagoinha. “O papel dos profissionais de saúde foi fundamental para que a menina exercesse seus direitos”, justifica. A garota foi inicialmente internada no Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip). O movimento de mulheres estranhou a demora para a oferta do aborto legal e convenceu a mãe da criança a encaminhar a menina ao Cisam.
O filme Direito e saúde, o caso de Alagoinha tem 29 minutos de duração e contém relatos de profissionais que prestaram assistência à família. A exibição será no auditório da Faculdade de Ciências Médicas da UPE, seguido de debate.

Um ano depois do caso, a garota e sua irmã de 15 anos, também estuprada pelo mesmo padrasto e portadora de deficiência, moram com a mãe em outra cidade. Lá recebem assistência psicológica e social, dada pela Secretaria Estadual da Mulher e prefeitura local. “Minhas sobrinhas estão muito bem. Estudam e vêm nos visitar. Não falamos sobre o assunto”, conta uma tia. Ela não se conforma com a violência sexual e diz que o irmão, pai das meninas, sofre. “Como elas vão se achar na sociedade?”, indaga, temendo repercussão na vida social das crianças. Diz que não é contra nem a favor de aborto, mas sempre foi favorável ao que era melhor para a sobrinha. “Como uma menina de 9 anos podia carregar outras duas crianças na barriga?”
O padrasto permanece preso, aguardando julgamento. O defensor público de Alagoinha, Ésio Freitas, diz que ele está arrependido. O processo tramitou com demora porque nenhum advogado da cidade aceitou assumir o caso. A mãe chegou a ser indiciada pela polícia civil, mas não foi denunciada à Justiça pelo Ministério Público por ausência de provas.